O Princípio da relevância Social – Compaixão e Graça
Ações de compaixão e graça fizeram com que as igrejas de Atos se tornassem relevantes na comunidade. Aquelas igrejas oravam e testemunhavam de Jesus Cristo às pessoas, mas tinham um coração compassivo, à semelhança do Mestre, que via as pessoas como gente e também suas necessidades de alimento, cura, libertação e, muitos milagres aconteceram no meio do povo. Se quisermos conhecer as pessoas precisaremos andar entre elas, como Jesus Cristo e os apóstolos fizeram. Ele realizou o que podemos chamar de ministério integral, pois viveu no meio do povo, amou, convidou as pessoas para que viessem a Ele e ofereceu a satisfação de suas necessidades físicas, emocionais e espirituais.
As igrejas de atos seguiram esse padrão e por isso encontramos vinte oito textos que tratam do cuidado mutuo, do pastoreio praticado pelos cristãos naqueles primeiros anos de sua existência, conforme seleção a seguir: (Atos 2.44-46; 3.3-8; 4.34-37; 5.1,2 e 14-16; 6.1,2; 8.2,7,8; 9.8, 32-34 e 36; 10.2, 23; 11.29,30; 14.8-10; 16.16-18,33 e 34; 19.12,13; 20.10,34-35; 22.12,13; 23.10 e 24; 27.3 e 43; 28.3, 8, 9 e 14).
Percebe-se que estas igrejas, ainda em tenra idade, sabiam que o ministério a desenvolver deveria ser integral. E o cuidado com as pessoas fez com que caíssem na graça de todo o povo e se tornassem relevantes naquela comunidade, impactando as pessoas incluindo os poderes políticos da época.
1. COMPAIXÃO E GRAÇA
Ações de compaixão envolvem a elaboração e execução de projetos que atendam necessidades específicas das pessoas e que ajudem a criar relacionamentos essenciais que permitam o testemunho do Evangelho. Alguns exemplos seriam: cursos profissionalizantes, educação, esportes e assistência social como pontes para o cuidado. Usa-se projetos esportivos, educacionais e de ajuda humanitária quando surgem catástrofes; isso tem aberto caminho para a pregação do Evangelho nas várias regiões do Brasil. Também podemos ter um programa de oração em favor dos enfermos em nosso grupo-alvo e ajuda àqueles que se encontram atribulados; isso deve fazer parte do trabalho ou ministério de cada pessoa transformada por Jesus.
1.1. Como escolher projetos relevantes
Normalmente focalizamos o cuidado apenas com a alma do indivíduo, mas deve-se pensar em ações que ajudem as pessoas em suas necessidades de alimento, assistência, educação ou profissionalização, pois quando os projetos escolhidos atendem necessidades legítimas da comunidade darão credibilidade àqueles que pregam o Evangelho.
Essas atividades podem ser desenvolvidas por agências, organizações, instituições beneficentes em parceria com pastores e missionários plantadores de igrejas através de projetos que demonstrem esse interesse nos vários aspectos da vida. São atividades que darão aos obreiros uma justificativa para permanecer em um determinado lugar, mesmo que as pessoas sejam indiferentes ao Evangelho. Barreiras e preconceitos são quebrados quando há projetos que visem ajudar as pessoas ou que demonstrem compaixão e graça.
1.2. Projetos que visem relacionamento
Um dos pontos mais importantes para evangelização, sabemos, é o relacionamento, é necessário aproveitar todas as oportunidades para desenvolver relacionamentos, aproximar-se das pessoas e compartilhar Jesus Cristo. Deve-se, com o uso da pesquisa, descobrir o que a comunidade necessita, para elaborar projetos dentro dessas necessidades e não gastar tempo e dinheiro com atividades que não sejam relevantes para essas pessoas. O melhor caminho é deixar que as próprias necessidades apontem quais os melhores projetos que devem ser executados naquele lugar.
Acompanhando o processo de plantação de igrejas por algumas décadas percebemos que alguns desses projetos sociais são bem-sucedidos enquanto outros não têm relevância social. A razão é simples: não atendem necessidades das pessoas e foram impostos pelos idealizadores sem uma pesquisa prévia adequada para saber o que de fato as pessoas precisavam. Em muitos casos não são frutos de compaixão e nem demonstram qualquer interesse às pessoas beneficiadas.
Vamos exemplificar com dois projetos, bem-sucedidos, que são executados por nossos missionários na região nordeste do Brasil.
Na cidade de Tauá no estado do Ceará (2010), nossos missionários trabalham com o projeto “ESPAÇO VOAR”, de apoio educacional a crianças de sete a dez anos de idade, que são atendidas com reforço escolar. O atendimento às crianças acontece de três a cinco dias por semana, com média de três horas aula/dia. No início os obreiros tiveram dificuldades para entrar nas casas, mas ao iniciar essa plataforma passaram a ter boa aceitação na comunidade e hoje a igreja está crescendo; os pais das crianças atendidas estão fazendo estudos bíblicos e sendo pastoreadas, e alguns já fizeram decisão de crer em Jesus como único Salvador e Senhor de suas vidas e assim as portas se abriram para o testemunho.
Na cidade de Patu no estado do Rio Grande do Norte, cidade hostil ao Evangelho, e um dos centros de romaria do estado, onde a igreja estava por aproximadamente 20 anos, com trabalho fraco e frequência aproximada de 08 pessoas, os missionários iniciaram suas atividades tentando descobrir como penetrar na comunidade e alcançar a cidade, e perceberam muitos meninos adolescentes e pré-adolescentes envolvidos com alcoolismo, drogas e malandragem. Nesse contexto resolveram iniciar uma escolinha de futsal. Fizeram o planejamento; conseguiram a quadra do ginásio de esportes da cidade; e começaram o trabalho com esses meninos, para os quais, na opinião de muitos, até mesmo de alguns pais, não havia mais jeito. O trabalho tem se solidificado, os missionários começaram a ensinar o futsal, mas também a Palavra de Deus, eles cuidam desses adolescentes. E hoje, muitos dos meninos atendidos, creem em Jesus Cristo como Salvador e Senhor de suas vidas. As famílias estão sendo abençoadas e a igreja se fortaleceu e está se multiplicando, com crescimento local e a plantação de igrejas em cidades próximas. Após o início dessa plataforma – atividade esportiva – os obreiros tornaram-se conhecidos e respeitados por toda a comunidade com livre acesso a todas as camadas sociais e nos lares para estudos bíblicos.
1.3. Aspectos a considerar
a)- Deve atender necessidades legítima da comunidade. Como dissemos anteriormente, é impossível conhecer as necessidades de uma comunidade sem andar nas ruas, conversar com as pessoas e ouvi-las.
b)- Deve facilitar a interação com muitas pessoas. A igreja não deve pensar em projetos para poucas pessoas, mas que atendam o maior número possível. Por exemplo: um projeto com meninos de rua – posso trabalhar com dez ou quinze, mas esse trabalho envolverá também seus familiares e será de impacto para toda comunidade.
c)- Deve permitir o testemunho do Evangelho. Seja qual for o projeto nessa área de compaixão e pastoreio, precisará abrir as portas para o testemunho do Evangelho de Jesus Cristo. Não fazer através desse trabalho um anzol para puxar as pessoas para Deus, mas uma oportunidade para que as pessoas pensem em sua espiritualidade e sintam-se desafiadas a crer em Jesus Cristo, recebendo-o como Salvador e Senhor de suas vidas.
d). Deve combinar com as habilidades e talentos dos cristãos envolvidos. É pratico realizar ações de compaixão na comunidade quando aproveitamos os talentos dos membros da igreja local, mas precisamos entender que pessoas não cristãs também podem ser mobilizadas para ajudar no atendimento às necessidades de uma comunidade, tais como: médicos, dentistas, enfermeiros, ou proprietários de supermercados, padarias, farmácias, ou de qualquer outra área. A igreja deve mobilizar as pessoas residentes para ajudar à comunidade.
1.4. Projetos para acesso e apoio financeiro aos obreiros.
É um tipo de atividade ainda não usada por nossos obreiros, que tem o sustento financeiro garantido pelas igrejas parceiras, por meio do PAM Brasil e ofertas missionárias. São projetos que requerem maior investimento para sua execução tendo por fim penetrar na comunidade mas também obter retorno financeiro, que pode ser usado para o sustento de obreiros autóctones ou gerar renda às famílias de plantadores de igrejas.
O apóstolo Paulo usou uma atividade de apoio – a fabricação de tendas – que lhe permitia acesso às pessoas com as quais ele queria compartilhar o Evangelho de Cristo e fazer tendas lhe garantia a permanência na cidade por um período de tempo mais longo e deixava-o livre para construir relacionamentos com as pessoas e lhe dava o apoio financeiro necessário para não depender de outras pessoas.
Depois disso, Paulo partiu de Atenas e chegou a Corinto. Lá encontrou um judeu natural do Ponto chamado Áquila, que havia chegado da Itália fazia pouco tempo, e sua mulher Priscila, sua mulher, porque Cláudio havia decretado que todos os judeus saíssem de Roma. E Paulo foi ao encontro deles. E, por exercerem o mesmo ofício, passou a morar e a trabalhar com eles, pois eram fabricantes de tendas. Ele debatia todos os sábados na sinagoga, e convencia judeus e gregos.
1.5. Questões importantes
a). Não deve atrapalhar o obreiro no cumprimento de seu ministério. Um dos perigos para igrejas e obreiros que atuam em atividades sociais é o envolvimento demasiado nessa área, desvinculando do pastoreio. Para ser bem-sucedido na plantação de igrejas, o missionário precisará ser disciplinado quanto ao uso do tempo, pois o trabalho social é muito envolvente e poderá prejudicar as outras atividades necessárias à plantação de igrejas. Nada deve tomar o tempo da proclamação do Evangelho e o discipulado, enfim, o pastoreio das pessoas, que deve ser atividade não apenas dos obreiros, mas de todos os cristãos.
b). Deve dar ao obreiro acesso àqueles que deseja alcançar. Como o objetivo principal é a salvação das pessoas, todas as atividades de cunho social devem dar a igreja ou ao obreiro acesso as pessoas para testemunhar de Jesus Cristo. Nenhum trabalho é válido se não abrir portas para pregação do Evangelho.
c). Deve combinar com as habilidades e talentos do obreiro. Como estamos tratando de atividades de acesso e apoio financeiro, principalmente quando se trata de missionários autóctones, as atividades devem combinar com as habilidades dos obreiros. Se o mesmo toca instrumentos musicais, domina a língua inglesa, informática, deve ministrar cursos nessas áreas, de acordo com as necessidades das pessoas de seu grupo alvo.
Não deve exigir muito dinheiro para começar a funcionar e se manter. Quando pensamos em projetos na área social, vêm à nossa mente a necessidade de uma estrutura física para a realização do trabalho o que envolve uma grande quantia financeira para construção e funcionamento.
1.6. Exemplificando com dois projetos
Abertura de colégios. No sertão paraibano, após alguns anos de convivência com as pessoas e muita conversa, detectamos a falta de escolas para atender as necessidades das crianças, principalmente no ensino fundamental. Nessa época já tínhamos espaço físico, templos e salas para educação religiosa, que eram usadas aos domingos, ficando ociosas nos outros dias da semana. Criar colégios batistas não seria fácil, e principalmente a manutenção e encargos sociais. Então criamos uma cooperativa de profissionais de ensino e trabalhadores em atividade meio, e através da cooperativa, formada de pessoas habilitadas nessa área, que são membros das igrejas da região, criamos vários colégios que funcionam até hoje com grande impacto na comunidade. A mensalidade cobrada dos alunos ajuda no sustento de obreiros da região e abre portas para testemunho do Evangelho em várias cidades.
Curso de Inglês e Espanhol. Percebemos que no Vale do Piancó, região formada por dezoito cidades, não havia nenhum curso de inglês e espanhol. Muitos adolescentes e jovens, filhos das pessoas de maior condição financeira nas cidades não tinham como estudar línguas. Então, vendo o espaço físico de nossas igrejas, fomos até a cidade de Patos, à 120 km, e desafiamos o diretor do Centro de Cultura Anglo Americano (CCAA) a abrir cursos em nossa região, oferecendo salas em nossos templos para o funcionamento. Isso foi relevante para a comunidade, abriu portas para a proclamação do Evangelho nas classes mais ricas e os obreiros tiveram bolsas para estudar inglês e espanhol sem sair do campo missionário.
Estas e outras atividades levaram as igrejas, como no primeiro século, a cair na graça de todo o povo. O respeito para com as Igrejas Batistas é notável nessa região. O espaço físico está sendo usado para benefício da comunidade. Essa deve ser a visão de todas as igrejas e o patrimônio precisa ser usado para o bem comum. É lamentável o número de prédios que são abertos duas ou três vezes na semana e passam a maior parte do tempo fechados.
1.7. Sugestões para escolha de projetos sociais
a). Reunir, a partir de pesquisas, as informações necessárias sobre o local – cidade ou bairro – para descobrir as reais necessidades daquelas pessoas. Essa pesquisa inicia com dados dos sites do IBGE, Atlas de desenvolvimento humano, Associações Comerciais, Federações de Indústrias, agências de desenvolvimento regional, entre outros, mas precisa continuar de forma presencial, ouvindo as pessoas e vendo a realidade.
b). Antes de começar qualquer atividade social é necessário perguntar às pessoas que residem naquele local se elas acham que aquela atividade vai ajudar a comunidade. Um dos erros que muitas igrejas e agências missionárias cometem, é elaborar projetos sociais sem ouvir as pessoas, o que tem sido desperdício de tempo e dinheiro, pois não causa nenhum impacto na comunidade.
c). Verificar se as pessoas que pensam em trabalhar com essa plataforma têm as qualificações necessárias. Se não, precisarão se assegurar de que obtenham o treinamento apropriado.
d)- Assegurar-se de que a atividade garanta aos obreiros o contato face a face com as pessoas.
Um dos grandes desafios na plantação e multiplicação de igrejas é chegar até as pessoas com quem desejamos compartilhar o Evangelho de Jesus Cristo e para isso é necessário que tenhamos um bom e aprofundado relacionamento com todos. Cada dia mais o missionário que deseja alcançar pessoas, levando-as à salvação, precisará cultivar amizade com elas, pois a tendência de nossa sociedade é o individualismo, onde as pessoas vivem para si mesmas. Chegou o tempo em que teremos acesso apenas às pessoas com quem tivermos relacionamento. A igreja de Jesus Cristo precisa aprender com rapidez a penetrar na comunidade, conhecer as pessoas e também as suas necessidades, tomando atitudes de compaixão para que as portas se abram para o testemunho do Evangelho e cuidar das pessoas.
Não há dúvidas quanto ao envolvimento de Jesus Cristo e a Igreja Primitiva com as comunidades, e da grandeza do serviço que fora prestado às pessoas daquele tempo. Jesus curou pessoas, libertou-as dos espíritos maus, alimentou-as e pregou-lhes a Boa Nova de salvação e isso foi feito também pelos apóstolos e as igrejas do primeiro século, o que serviu de testemunho e impactou pessoas e cidades inteiras naquela época. E a igreja caiu na graça de todo o povo .
Se quisermos idênticos resultados, é preciso nos mover em favor da comunidade onde queremos pregar o Evangelho. É necessário que andemos onde as pessoas estão para sentir suas reais necessidades e isso fará toda a diferença no ministério. A Junta de Missões Nacionais tem investido pesado em projetos sociais e de ajuda humanitária, entendendo que esse é também o trabalho da igreja. Estamos ministrando compaixão e pastoreio! “Porque a mensagem que ouvimos desde o princípio é esta: que nos amemos uns aos outros” .
A expansão da obra missionária em nosso país implica na missão integral que Jesus Cristo ensinou. A evangelização, o discipulado e a prática do verdadeiro e genuíno amor aos nossos semelhantes. Trabalhar com vidas marcadas pelo abandono fundamentados na compaixão e pastoreio são a essência do caráter de Deus.
É preciso desenvolver, com excelência, estratégias ministeriais criativas que visam promover a inclusão social e atender as questões sociais críticas que afligem a população do Brasil. “Logo que a viu, o Senhor se encheu de compaixão por ela e disse-lhe: não chores” . A compaixão bíblica é um chamado ao compromisso proativo de obediência e ações práticas. Estamos investindo naquilo que é eterno, para a transformação de vidas, disseminando a prática do verdadeiro e genuíno amor aos nossos semelhantes.